30.6.06

o sábio

Quis ser poeta. Depois quis ser somente escritor. Passou a nobel artista, escultor, sonhou-se arquitecto, médico, doutor, engenheiro, veterinário, biólogo, cientista e professor. Imaginou-se de barco à vela, numa praia perdido, servindo bebidas, vendendo missangas, dormindo na rua, sofrer para escrever, ser poeta, escritor. Quis tudo. Intensamente. Quis tudo tão depressa como se o pudesse haver sido já desde ontem. Quis tanto ser tudo que consta que quis inclusivamente, por um período igualmente sôfrego, não ser rigorosamente nada. Foi nesse momento, consta, que pôde garantir a si mesmo ser tal qual como se gostava de chamar: Sábio; o homem sabedor da vida e nos seus passos perdido.
No fim dos seus dias, ao falecer, jazendo miudinho, traquejando e fedendo o corpo inteiro, revelou ainda douto que a vida toda não havia sido mais do que esses cinco minutos querendo o nada, com a consciência tranquilamente desassossegada de haver querido e alcançado tantas outras coisas. Revelou, suspirou, sorriu e a filha prostrada junto a si deu-lhe a mão apertando-a forte e triste contra o seu próprio corpo. Em seguida, cerrou a pestana e disse adeus sem acenar.

frases no metro

las mentiras y las verdades son hechas de una misma cosa: Palabras

29.6.06

problemas de memória

"Só tenho 8 Megas de RAM e o vinho faz-me resets." João Esquecido

procela

nem simulado,
nem dado por achado,
(nem brando),
anda por aqui brandindo,
o vento esmorecido.

paradoxo da fadiga

Assim como existe o trabalho de uma maña, o trabalho de um dia, o trabalho de uma semana, o trabalho de um mês, o trabalho de um ano e, no final, o trabalho de uma vida, existe de igual forma um cansaço proporcional: o cansaço que se tem no final de um dia é por exemplo distinto do cansaço de um mês e o descanso que se exige é-lhe, novamente, proporcional. Até aqui tudo bem. O paradoxo que por ora me habita surge quando, passado quase um ano de trabalho, o meu corpo demanda descansar o cansaço proporcional acrescido de um quanlquer expoente três.

28.6.06

Emboscado

...durante intermináveis meses impossíveis por hoje de quantificar, confesso que embaído de uma sorte que me fizesse sobre Ella ter uma qualquer posse, pensei que nesse dia, apenas eu a esperaria.
Quando no dia que terminou a delonga da espera a fui esperar à estação essa e a vi aparecer assim na minha vista, como pretensa deleite e aura de princesa inesperada, ensejei fisgá-la com ambos olhos convicto que da cauda dessa seta penderia o fio que a guiaria junto a mim. Ella esperou bem esperada, fez-se fisgada e mirou-me com olhos já molhados de suor, o lábio já trincado pelo desejo. Imóveis, nesse espasmo de condição perdurámos a maior pequena fracção de toda a minha vida. Depois não sem uma ponta de desdém, Ella deixou ficar um olho só fechado como quem o piscasse só para mim e foi-se com a outra vista para outro destino, e eu dele apartado.
Só então olhei em volta.
Foi somente então me dei conta, não sem mágoa, de não estarmos sós.

Vertigo

Tinham ambos tanto receio do que já antes os havia perturbado que o mais profundo que alcançaram nessa paixão nova que os unia -antes mesmo que se desentendessem no amor ou que as razões da perturbação surgissem- foi o fundo do primeiro precipício que se lhes deparou e sobre o qual se despenharam deliberadamente quais loucos inconscientes porque conscientes de tudo menos do seu próprio absurdo.

26.6.06

Este não é um post sobre bola

...nem sobre o nu integral da Victoria Beckam, nem sobre o próprio do cu do Beckam. Ele próprio.

É um post fútil e de inconsequente ordinarice para medir o pulso a quem por aí anda em busca de letras ou de suprir com uma mamada a saudade.

Pois bem, fiquem sabendo que aquí não se fala da Pamela Anderson a chupar a pila do Tommy Lee, nem dos filmes do Tomás-Taveira-tá-todo-lá-dentro-do-cu-da-querida. Aquí ninguém chupa pila, ninguém faz broche, minete ou botão de rosa. Também não é aquí que a Britney beija a Madonna, que a Janet mostra o bico da teta ou que a Cicciolina se masturba em directo. Aquí não se faz nada disso até por que aquí há leitores de idade que não querem, não podem ou nem conseguem saber de travestis, transexuais, bichas rôtas, maricas, paneleiros, lésbicas, bisexuais, gays. Muito menos de sexo grátis, de 300GB de free downloads de sexo grátis! Aquí não há hotbabes.com, freesexs.net, ejaculations.net, lolitas.org ou chicksonspeed.mp3. Nada disso, este é um blog sério, que fez ontem anos e quis subir o número de visitas. Isto é um Smile, cause you’re on Candid Camera! É um anda cá malandrão, que t'apanhei-te c'a pila na mão!

Ephemerís VI

Este blog cumpriu ontem, trezentos e trinta e três postes depois, o seu primeiro (provavelmente unico...) aniversário. A mim, tive a delicadeza de me oferecer um fim de semana em Paris da França, à descrição do qual, faço tenção de vos poupar. Digamos que foi bom. Muito bom. Digamos que se de Paris se dissesse que nem bons ventos, nem bons casamentos, eu passava a escrever-vos sem qualquer lamento, a partir de lá. Aos BonsVentos dediquei o intento de lhe oferecer uma nova cara, uma nova letra, novos leitores ou novos escritores. Embargado, quem sabe, por um propósito não tão resoluto, um afinal tão simples desígnio não vingou e redundou em tão somente um post que a este se segue e que seguramente lhe fará ampliar as visitas em mais de três mil por cento. A oferenda ainda que de manifesto mau gosto, tem a frágil legitimidade de quem, em tempos de mundial da bola, do qual sabe vir a chegar à final, não lhe dedicou -nem lhe dedicará- um textozinho apenas. Nada de ópio pró povo.
Quanto ao ano que passou de palavras discorridas, promessas incumpridas e sonhos partilhados, fica registado tão somente o agradecimento. Aos que me lêem com mais ou menos dedicação, sobretudo aos que após uma primeira visita criaram o hábito ou abriram o precedente de regressar. É coisa boa, quase sempre coisa quentinha. Bem-hajam.

22.6.06

Condição: Arquitecto XIV

(...)à pergunta dela

...bastou-lhe responder o Sim.
– Sim, quero – foi o que disse nessa vez. Foi contudo, uma vez igual a tantas outras em que se sempre optara pelo talvez, pelo talvez sim, pelo talvez não ou pelo quem sabe?
Foi nessa inesperada vez, sentido-se guiado pela rubra luz e uma razão de todo inexistentes, que de uma assentada matou todos os fantasmas e deglutiu todos os demónios. Foi a partir desse inopinado ápice que a nova rebelada vida se lhe abriu de par em par. Foi a partir desse sempre temível Sim que perdeu para sempre o receio que lhe respondessem sobre a coisa alguma um Não.

21.6.06

baixio altruísta

(...) andava por aqueles tempos tão obcecado com o destino da humanidade e a saúde do mundo que se lhe fugiu a mulher, se lhe ardeu a casa, se lhe atropelou o cão, se lhe roubou o carro e se lhe foi o emprego e de nada fez gordo caso. Tempos mais tarde, quando cabisbaixo reconheceu por fim que jamais o mundo havia sido são, apercebeu-se –já era tarde, demasiado tarde- que o destino da humanidade afinal, enquanto o suponha por diante, lhe estava passando ao lado.

20.6.06

o burocrata

Chega bafejando o cansaço não curado, o leito descurado, as pernas esperando tic-tac-tic-tac a hora da sesta, o dia de sexta. Lá, no lugar dos computadores acesos, das almas paradas, das teclas batidas, dos cifrões contados, ao espírito não se lhe ocorre ocorrer-lhe algo. Não discorre, não concorre, não percorre. Nada. Amorfo. Cumpre apenas. Cumpre o dia que compete ao diário; as papéis paqui-pacoli, os livros pesquisados – sempre os mesmos –, os sites acedidos – sempre os mesmos -, as conversas mantidas – sempre as mesmas -, o café da maña e o da tarde – sempre à mesma hora -. E encomenda de lá pa cá e de cá pa lá. Vende, encomenda, inventa, compra. Cumprindo apenas. Ao certo dia – na noite, que é o que sempre lhe resta – senta-se por fim sem meio, sentindo por fim sem esteio, e fica zonzo vendo a vida vendida, rota, vendo por fim o peio. Deixa-se assim ficar olhando em vazio, o vazio de tudo, tragando o vinho diário, nestes dias, sem o medo diário de amanhã. É assim que de trago em trago, como quem deglute o hausto, se sara da faina, desejando o desplante da vida errante. Dessa ébria condição em que se concede extasiado um outro dia de amanhã, sai invariavelmente, na própria maña seguinte, ao tanger do despertador das oito. Nega-se uma, nega-se duas mas à terceira, erguido a custo, enceta tudo de novo a par de suspiros profundos. Resolve a higiene, alimenta a tripa e lesto sai de onde apenas quatro horas antes o vinho o havia abandonado. São vinte minutos baixo terra - vinte minutos apenas - até chegar bafejando o cansaço não curado, o leito descurado, as pernas esperando tic-tac-tic-tac a hora da sesta, o dia de sexta.

16.6.06

vou correndo...

...atrás do prejuízo...

15.6.06

S.O.S. desenvolvimento sustentável

Saudades III

...do tempo Dos. Ms-Dos e jogos a fazer brrrr, brgggg, brggghhhh antes de loadar...
... nada de windows, internet, downloads, emails, blogues, auocades2005...
...nem sei porquê grita assim por vezes a saudade...
...talvez da consciência que daqui advém o conforto e a facilidade mas que da evolução não há porque esperar a felicidade...
....ah, e um teclado negro, teclas de borracha, indicações a cores e um arco íris ainda fazem falta...

tudo ao móllo

Em Madrid, recorrendo na presente semana à bicicleta, o unico meio de transporte que ainda faltava experimentar para chegar ao local de ofício, apercebo-me que em prol da segurança, mais importante do que saber de onde é que eles vêm, é aperceber-me de onde é que eles NÃO vêm!

14.6.06

Rugas

Já começo a ter as primeiras rugas / Rugas... / Começam-me a nascer as primeiras rugas
Rugas de chorar / Rugas de sorrir / Rugas de cantar / Começo a franzir / Rugas de chorar / Rugas de sorrir / Rugas de cantar / Rugas de sentir
Rugas...

13.6.06

Mudo

quando a lingua de sempre não serve já para dizer o que se deseja, o homem mira pausado e não sem vergonha o dia de amanhã e hesita uma, duas, três vezes entre dizer o que almeja ou como almeja. Nesse momento então o homem quer ser mudo, quer que todos sejam mudos, quer que os olhos houvessem sido desde o primeiro dia, o veículo unico das palavras que vêm de de dentro.

7.6.06

Portugal, livro de Guiness

Que mais dá se a economia teima em não crescer se somos os reconhecidos titulares da maior empada de legumes alguma vez cozinhada, o maior bolo de noiva, a maior panela de caldo verde e a maior sopa que por acaso até é um delicioso gaspacho alentejano do Cercal, o maior cálice do mundo, a maior concentração de pai natais, a maior bandeira humana, o record mundial de colocação de música por um só DJ, etc, etc, etc, e desde Janeiro a maior estação de painéis solares do mundo?

Café da Mañã XXXIV

Onze horas dormidas e a pasmaceira mantém-se; das duas uma: Ou fui picado pela mosca Tsé Tsé, ou tomei demasiadas drogas.... É que o corpo não reaje, os olhos não abrem, a cabeça não funcemina...

IBERIA / Agenda

6.6.06

Dia do cão

Alex. O meu cão. Para ele, todos os dias são dias do cão....

Ella contestó

“sé que una ciudad está naciendo de tus ojos” dice salvador.

não desejais. produz.ii.

(...)Vai-te! tarefa inutil e desnecessária. Vai-te que ninguém te quer, vai-te que já não te quer o mundo. Pouca-terra, pouca-terra, produz cidadão, executa, faz, dirige, lança a empresa, cimenta a pedra. Faz. Ou faz que fazes mas apresenta-te ao trabalho de cara lavada e a horas correctas. Diz que nada fizeste. Ou só o trabalho de casa. Diz que não conheces o vinho, nem a embriaguez, não sabes de amor nem nunca conheceste o sexo. Diz que não te peidas, fala escorreito das tuas três horas de exercício continuado.Dos cinco livros que leste – simultaneos - e dos jornais. Faz-te de interessante. Apresenta-te. Debuta. Expõe.
(...)

não desejais. produz.

(...)Escondam-se as mulheres, aparte-se o desejo, olvide-se o amor. Lancemo-nos na modorra competente de não desejar o que se não tem, de se quedar com o que rigorosamente nos compete. Abaixo o lirismo, as caminhadas flutuantes, as caminhadas delirantes do espírito, as caminhadas solitárias e de uma vez por todas com as caminhadas a dois.
(...)

5.6.06

Ella

Estava escrito, e pelo Salvador construído, que os seus lábios haveriam de ser especiais.

quando o menino cresceu

...cresceu tanto que antes que se apercebesse era já menino-corpo-feito. Nesse lesto e desapercebido processo foi aprendendo -e apreendendo- tão bem a deixar por jorrar as lágrimas que eram só suas que quando num dia o corpo-já-feito se lançou num pranto, o choro contido lhe foi inundando o corpo até se lhe afogar o ente.

A propósito do fim-de-semana

Férias é aquilo de que se necessita para descansar depois da loucura e frenesi de umas férias.

2.6.06

Condição: Arquitecto XIII

"(...)É então um conservador?
- É como a amigável discussão que eu e o Eduardo (Souto Moura) mantemos há anos sobre os rodapés. Ao contrário dele, eu nas minhas obras ponho sempre rodapés, como esse aqui do gabinete. Repito-me muito. Inventar é muito difícil"
Alvaro Siza

Pontos nos ii's

Recebo e-mail de primo enervado, residente em Londres vai para quase dez anos, sempre tanto mais orgulhoso de Portugal quanto desiludido com os protugueses: Frisa ele que em português, as ‘Capital Letters’ só se deveriam pôr nos nomes próprios, depois de um ponto final, ou na principal palavra de um título. Não, nunca, jamais, como eu –oh herege, reles herege, assassino declarado da lusografia- faço insistente e erradamente na blogografia

Café da Mañã XXXIII

Família de vista 'ao menino' (eu!). Caldo verde para o jantar, uma vinha de alhos que-só-falta-aquecer, pezinhos de salsa e de coentros, café Delta-torrado-moído-para-saco e uma catrefada, repito: ca-tre-fa-da de jornais, revistas, promoções, correio e papeladas mais para passar os olhos nas horas todas. Nas horas vagas, no trono de defecação, no antes de dormir, no depois de acordar, ao pequeno-almoço. Como hoje: Pela manhã, passo os olhos divertido e atento nas Vips, Caras e outras publicações de igual tema e pantone: títulos a branco sobre fundo vermelho. No Miguel Beleza com a Alberta Marques Fernandes, à Pipinha que foi trocada por outro mas também arranjou outro que a Cinha acha que lhe faz bem, o Tom Cruise, pai de uma e a Nicole que não se recompõe, a festa de despedida do Inverno e o Jezebel e as tias e caquéticas esticadas, o casamento na praia de um qualquer Balsemão e deputados do CDS também na praia com mulheres super-chic's mas feias de se cair para o lado, morangos com açucar, o Zé Castelo Branco -noblesse oblige- no aniversário de um cirurgião com pinta de proxeneta e a Betty de tetas esticadas, e mais mulheres de tetas esticadas e ainda mais morangos. A mãe da-não-sei-quantas, e o Zé Manel de Vimioso ou de Santo-António-dos-Assobios-para-o-Lado que também é primo do-não-sei-que-mais. Nenhuma foto da Rocio Jurado e nem um comentário ao Pai Iglesias e à Ana Obregon. Mais festas, vernissages, cocktails, lançamentos de bric-a-brac e a Margarida Prieto arredada de Lisboa com velhas-como-já-ela em chás no Estoril. Uma diversão pela maña com direito a gargalhadas. Longe da Ocidental Praia, coisas SIMPLES como o Jet-Set nacional assumem a sua dimensão real e, convenhamos, ganham uma dimensão de ridículo que não seria má ideia que as trezentas e tantas mil pessoas que compram esta literatura se apercebessem. Sei que este fenómeno nem sequer é português, mas com franqueza; o Nelo Vingada de férias na Quarteira e uma sessão fotográfica da Rita Ribeiro em biquini, repito: bi-qui-ni?!?!?!

1.6.06

Arroz de estragão

O homem andou escondido ou perdido num mundo tão só seu que nunca se chegou a alcançar a verdade plena sobre o assunto, nem sequer se soube chegar à conclusão se haveria um assunto para que se houvesse dedicado a ele. Deixou-se de coisas e deixou-se ademais de tantas coisas, que de muitas passou a nenhuma e nós -eu- posto o período farto, resistimos nem tão estóicos à fome. Total.
Agora voltou. Já havia voltado há uns diazinhos mas apenas hoje quis -ele- que ao feito feito se lhe dedicasse o post de jeito. Eis a não perder um filme já antigo, de amigos de sempre, na senda do entendimento do que é o fado da Condição de Arquitecto.

Café da Mañã XXXII

Nestes dias inesperados, em que sem razão determinada nem aparente, o Sol de estorricar passarinhos se esconde sem que ninguém saiba muito bem onde, Madrid desperta com vontade que se acorde junto a ela. Depois, outros dias há, em que à falsa timidez deste Sol continental se lhe junta uma brisa fresca que de tão agradável parece de Lisboa feita. Nestes mesmos dias, invento um novo percurso: entro no metro três paradas depois ou saio duas antes, escolho -discorro- a mais apartada saída para a rua, caminho a passo de idoso ou de lesionado e, quando finalmente chegado à porta do local de ofício, resto sem pressas fumando um cigarro, imaginando com aquela nossa saudade triste que a Caparica está ao virar da esquina, que o Tejo está ao virar de uma colina.